quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Precisamos continuar falando sobre abuso e assédio


Recebi este e-mail de uma leitora e não sei como responder. O mundo perdeu um pouquinho do brilho, sabe? Por motivos óbvios eu vou ocultar os nomes dos envolvidos e dos grupos.
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Oi Betão. 
Meu nome é Sandra (fictício), sou de XXXXX e até pouco tempo atrás eu treinava com o pessoal do XXXX. Treinava. Eu não treino mais. Rolaram algumas coisas no meu grupo de sword que me fizeram abandonar o esporte. Estou mandando esse e-mail para você porque quando eu e você conversamos no XXXXXXX, você pareceu ser um cara legal e simpático. E também porque o meu psicólogo disse que eu precisava desabafar com alguém. Ajudaria no processo de “cura”.

Eu comecei no sword bem cedo. Tinha uns 13 para 14 anos. Logo que entrei no grupo um dos líderes me adotou como pupila. Ele era super atencioso comigo, me ensinava um monte de coisas... foi o pai que eu não tinha em casa. O nome dele é Tiago (fictício). Bem... desde o começo eu sempre fui quase que uma filha pra ele. E por muito tempo ele cuidou de mim como filha mesmo. Mas aos poucos isso passou de simples relação de pai-filha pra mais algo um pouco mais complicado. Quando eu comecei a namorar uma menina de outro grupo, a Geni, ele não gostou.

Houve uma treta entre ele (o Tiago) e “Rei” do XXXXXX, um grupo meio que treinava perto da gente. Foi feio. Eu e a Geni tivemos que acalmar os ânimos dos dois. Ele então começou a cortar os laços com as pessoas que treinavam no outro grupo, sabe? Só que a gente já se conhecia de outros rolês. Hoje eu sei que ele não tinha esse direito, de me proibir ou de proibir quem quer que fosse de ter contato com a galera do XXXXXXXX. Hoje é óbvio q não, mas sei lá, eu achava que tinha... Poxa ele tinha cuidado de mim, e no começo eu me senti meio presa no meio dessa treta.

Ai tudo começou a ficar pior por conta de um treino que não fui. Minha mãe pediu que eu ficasse em casa (ela tinha acabado de voltar de viagem). Por coincidência a Geni também não foi no treino. Apesar de eu ter MANDADO UMA FOTO PRA ELE COM A MINHA MAE, ele veio brigar comigo porque eu não aparecia na foto. Eu tenho até o audio dele dizendo que não acreditava em mim, que era melhor eu não deixado de ir para o treino para ter saído com a Geni... porque aos olhos dele, isso seria alta traição.

Eu comecei a ficar meio paranóica, porque eu pensava que todo lugar que eu estava ou com alguém do XXXXXX ou a minha própria namorada, ele iria brigar. A situação piorou muito desde então. Eu mal reconhecia o cara gentil que me ensinou a empunhar uma espada! E tudo meio que explodiu quando ele veio brigar comigo porque eu fui numa festa que o grupo da Geni organizou. Ele me acusou de traição e tal. Ele disse que “ou você está comigo ou está contra mim”.

Só que nossa amizade chegou num ponto que ele só me convocava para trabalhar pro clã. Eu sempre era escalada para ir em eventos e feiras. E ele nunca me perguntava se eu tinha disponibilidade. Deixei de fazer um trabalho da faculdade por causa de uma dessas convocações. Ele disse que eu eu a filha dele; ele não tinha que pedir e eu tinha que obedecer. Teve uma vez que ele simplesmente me mandou ir, mesmo sabendo que eu estava ardendo em febre. Se não fosse pela Geni e por uns amigos, eu poderia ter me dado muito mal.

Depois desse dia, meio que a ficha caiu, e então eu decidi sair. E poxa, eu escrevi um texto tão de boa, avisando que ia sair, agradecendo por todos os ensinamentos... Betão, eu tenho tudo para provar cada palavra do que eu estou dizendo aqui. Prints, áudios, tudo. Mesmo. Tenho mais de 40 prints que provam que eu tentei de TUDO. Eu estava exausta. Esgotada. Até minha mãe percebeu que eu não estava bem. Comecei a ir mal na faculdade. Quase perdi um emprego legal por conta dessa situação toda. E tenho certeza que magoei algumas pessoas no caminho. Minha mãe descolou um psicólogo da prefeitura para mim.

Foi foda. É foda ainda. Marquei um dia para devolver minhas coisas. Meu tabardo, minha patente, a espada de fibra que ele fez para mim no meu aniversário de 15 anos. Eu ia sozinha. Mas aí o pessoal do grupo da Geni disponibilizou uns guerreiros para me acompanhar, para que eu não fosse sozinha, saca? Na verdade, eu pedi para eles irem comigo.

Posso ter errado nisso, mas eu estava com medo, entende? Não sei se você entende, mas eu estava com muito medo. Eu sabia que se fosse sozinha ele ia fazer alguma chantagem pra me fazer voltar. Sei lá. Ele poderia me humilhar na frente dos outros, como ele vinha fazendo ultimamente. Cara, hoje eu percebo que eu estava com medo de levar uma surra dele!

O resultado você já deve imaginar: Ele baniu de tudo, treino, evento, família.... Até do “coven” onde ele era meu mestre... até de lá ele me baniu. Ele me tornou uma persona non grata. Qualquer um que tenha contato comigo tá arriscado de suspensão ou de perder patente.

Quanto eu e a Geni, bem, estamos firmes e fortes, acaba que o amor vence tudo. Ela ficou ao meu lado em tudo e me abriu os olhos para a manipulação em que eu estava. Então ele espalhou para todo mundo que eu tinha traído o clã. Poxa, eu tô com a consciência limpinha, saca?

Mas o meu doutor me aconselhou a largar o sword. Tem muito gatilho lá. De vez em quando eu vou ver a Geni treinar, bate uma saudade, mas eu sei que estou melhor assim.

Eu queria que você publicasse o meu relato. Dá uma corrigida antes, tá? Sei que você é professor e eu deixo você consertar o que precisar no meu texto. Mas publica ele? Tem muita gente que lê o seu blog. Muita menina também. Quem sabe, se elas pudessem ver o que se passou comigo, sei lá, pudesse servir de alerta para elas. Se quiser esclarecer algum fato ou ver algum print, é só me dar um oi.
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Não sei o que dizer. De verdade. Que sirva de aviso para os outros, Sandra. Como você pediu.

Um comentário:

  1. Eu nunca quis TANTO quebrar alguém em pedacinhos quanto eu quero quebrar o "Tiago".

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