segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Abuso de poder no swordplay

Mais um artigo, mas dessa vez a sugestão foi dada pelo meu amigo Victor da Silva.

Olá Betão. Queria que você fizesse um texto em seu blog a respeito do abuso de autoridade no swordplay. Ou seja, o cara que tem a patente maior, ou sua patente pertence à nobreza que comanda as patentes menores, desmerece pessoas que tem patente menor, não escuta ideias do grupo, chegam até humilhar, enfim. A falta de humildade com as pessoas que alguns líderes têm. Um texto sobre a liderança resumindo, só isso.
Valeu, abraços.
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“Se quiser por à prova o caráter de um homem, dê-lhe poder” (Abraham Lincoln)
Um aviso antes de começarmos. Se você não gosta de filosofia e acha que é tudo loucura da esquerda pare de ler por aqui. Tenho outros artigos aqui no blog que você pode se interessar. Mas esse aqui, especificamente, eu trabalho sob a ótica da filosofia. Para ser mais exata, a ótica prevista pelo autor Michel Foucault (pronuncia-se Fuucô).

Na sua obra “Vigiar e Punir”, Foucault apresenta um amplo estudo sobre a disciplina na sociedade moderna. Nas palavras parafraseadas do autor “uma técnica de produção de corpos dóceis”. Foucault analisou os processos disciplinares empregados nas prisões, considerando-os exemplos da imposição, às pessoas, e padrões "normais" de conduta estabelecida pelas ciências sociais. A partir desse trabalho, explicitou-se a noção de que as formas de pensamento são também relações de poder, que implicam a coerção e imposição.

Aliás, todas as nossas relações com os outros são relações de poder. Ao contrário do que a maioria das pessoas acredita o poder não vem apenas de forma piramidal, vindo do topo para a sua base, mas sim acontece em formato de “teia”, espalhando-se em várias direções. Esses “micro poderes” estão presentes na obra de Foucault. Ele afirma também que não é possível possuir o poder, como se fosse um objeto, mas tão somente fazer uso prático do poder.

“Tá bom... eu te dei uma chance Betão. Tô aqui faz três parágrafos ouvindo falar sobre esse filósofo que mais parece o ‘Tio Chico’ (uncle Fester/tio Funério) da família Adams e ainda não entendi o que picas isso tem a ver com o seu artigo”, perguntou o rapaz com bata branca e cabelos desgrenhados, magro como um sibito, portando duas adagas de EVA.

Ora meu amigo, as relações que temos uns com os outros são relações práticas de poder. Logo, o abuso por parte dos líderes nada mais é do que um crime de poder. É uma forma de controle social, em que a submissão do outro é o que importa.

“Grandes poderes trazem grandes responsabilidades!” (Stan Lee/Ben Parker).
“Poder corrompe. Poder absoluto corrompe absolutamente”. (John Emerich Edward Dalberg-Acton – putz! e eu sempre pensei que era de Rousseau!)
As consequências de um tratamento grosseiro no ambiente de treino são sérias e comprometem o resultado do grupo como um todo. “O jogador fica menos criativo, produz menos, joga com menos qualidade, se torna menos ousado e, no limite, deixa de jogar”, afirma a estudante de psicologia e ex-jogadora Mariana F. Lima. Além disso, uma pessoa maltratada num local que deveria ser uma fonte de alegria e prazer reage de forma negativa, em certos casos retaliando abertamente.

Tanto homens quanto mulheres fazem parte desse time, indiscriminadamente. A diferença está em como cada um se manifesta. Enquanto eles reagem de maneira ostensiva, gritando impropérios, por exemplo, elas não usam palavrões nem aumentam a voz, mas sabem exatamente como ser cruéis e abalar a autoestima do colega jogador.

Os motivos para atitudes desse tipo são variados: vão desde o líder de clã inseguro que precisa se respaldar no medo do subordinado para se sentir competente até aquele que é assim por puro prazer ou falta de informação.

O pior é que este comportamento rude, de abuso de poder, tende a ser copiado. Estatisticamente falando um a cada quatro jogadores acreditam que ser líder “é ser bruto e grosseiro”. Essa é a mesma estatística revelada por uma pesquisa americana que lida com o abuso de poder no ambiente corporativo. Ainda há os que acreditam piamente que estão fazendo um favor a seus colegas de treino.  “É a síndrome do treinamento de anime”, como afirma Mariana, “eles agem de forma rude, pois acreditam que isso ajuda seus comandados a aguentar a pressão. Como se fosse um treinamento para que as pessoas sejam mais fortes”.

“Você é a doença, eu sou a cura” (Sylvester Stallone)
“E como lidar com isso tudo?”, pergunta a menina baixinha de cabelos encaracolados que está terminando de por silver tape numa lança novinha. Ao entender que se trata de uma relação de poder, você deve interromper o fluxo de poder daquela pessoa.

Com a ajuda da Mariana eu elenquei 6 atitudes que você pode tomar para ajudar a resolver sua questão.

1 Seja racional. Enfrente a situação como se fosse mais uma tarefa do dia-a-dia, sem deixar a emoção interferir. Chorar ou sair correndo não ajuda, tão pouco guardar os sentimentos ruins para si e ficar chateado também não. O ignorante é ele, não você. Seja educado, porém firme: “Olha Paulo mesmo sendo líder você não tem o direito de falar comigo dessa forma. Exijo que você demande a mim o mesmo respeito que eu demando a você”.

2 Evite o confronto (se possível). Evitar conflitos é mais inteligente a se fazer, mas tem horas que você simplesmente não consegue. Nessas horas não caia na tentação de usar as armas da oposição. Seja simples, assertivo e firme. “Escute aqui Lucas, eu entendo que a estrutura do nosso grupo tem uma estrutura militar, mas acho que você está abusando de sua posição de liderança. Aqui não é o exército. Estamos aqui todos para nos divertir e não para ser humilhados. O trabalho do líder é nos guiar para que possamos melhorar e não nos fazer sentir pior a cada vez”.  

3 Mantenha a tranquilidade. Fale com seu líder tirânico o mais baixo e calmamente possível, como se nada estivesse acontecendo. Em algumas situações, vale até pedir para ele repetir alguma ordem, caso você não tenha entendido. E pense sempre antes de responder a uma grosseria.  “Dá para repetir, por favor, Andréia? Não entendi o que é para fazer”.

4 Lembre-se do Capitão Planeta (ah como me senti velho agora): o poder é de vocês. Ele é o líder do grupo, certo? Mas ele só é líder do grupo porque existe um grupo. E o grupo só existe porque tem pessoas que o frequentam. Ou seja, é você e seus colegas que permitem que o líder chato os trate assim. A partir do momento em que vocês se organizam e demandam o tratamento adequado das duas uma: ou o cara se conscientiza e muda ou ele se muda do time.

5 Escancare o verbo. Se ser discreto não está funcionando jogue a merda no ventilador na frente de todo mundo. Busque o conselho do reino ou se uma a outros colegas para exigir o seu direito: o de ser tratado de forma digna. Porque, no fim das contas, um título é só isso: um título. Não vale nada.


6 Se nada mais deu certo, parta para outra. Ficar no grupo quando o abuso continua só vai piorar para você. Saia de lá e monte seu próprio grupo. Contate os descontentes com a atual gestão e bola para frente. O importante é ser feliz.  

terça-feira, 20 de setembro de 2016

Assédio no swordplay




E tudo começou com um e-mail
Olá tio Betão (rsrsrs)
Como vai? Eu me chamo XXXXXXXXX, tenho XX anos e atualmente treino swordplay com o grupo XXXXXXXXX aqui de XXXXXXXXX. Eu sempre leio seu blog e gosto muito da forma que você escreve. (...) Por conta da faculdade ando meio afastada dos treinos, mas sempre que posso dou uma escapadinha para treinar. (...) O motivo do meu contato é que eu queria pedir que você escrevesse um texto falando sobre o assédio que as meninas sofrem dentro do swordplay. Eu mesma sofri muito assédio quando eu comecei, mas parece que as coisas deram uma estabilizada. (...) As coisas só começaram a mudar quando eu me impus e disse que não ia mais aceitar que ficassem passando a mão em mim. Gostaria que você não citasse o meu nome ou o nome do meu grupo, até para evitar desavenças. Um dos líderes do grupo é machista pra caramba e uma vez ele disse que gente como eu (mulher e feminista) não fazia falta no grupo “dele”. (...) Obrigada.
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Assédio. Poucas palavras mexem com as pessoas como essa palavrinha é capaz de mexer. Desde que recebi esse e-mail eu me senti profundamente incomodado. Eu não sou ingênuo para achar que num esporte tipicamente masculino como é o swordplay não haveria machismo ou assédio, mas eu não achava que seria tanto.

Tão logo eu tomei ciência da situação comecei a contatar amigas e conhecidas dentro do jogo. Comecei pelas pessoas que treinam comigo e depois fui expandindo o círculo de pesquisa até chegar a jogadoras de outros estados e até mesmo uma pessoa que morava no Brasil e agora joga nos Estados Unidos. O objetivo deste artigo é, portanto, dar voz a essas meninas que sofreram nas mãos de alguns “swordplayers”. Este é um texto para conscientizar e alertar as pessoas sobre esse problema. Quero deixar claro que nada aqui é “mimimi” ou “frescura”. São todos relatos de dor, sofrimento e humilhação que foram sentidos por outros seres humanos. Não podem (e não irão) ser tratados levianamente.

Por questão de segurança vou chamar todas as meninas deste texto de “Kriger”, que significa “guerreira” em língua escandinava.

Um universo de possibilidades
A primeira coisa que eu descobri quando comecei a pesquisar empiricamente sobre o tem é que não existem duas histórias iguais. Cada menina vê/sente/sofre o assédio de forma diferente, única e intransferível. Cataloguei casos que iam desde relacionamentos doentios que começaram no campo de jogo passando por expressões interessantes como “os meninos alegres” e até meninas que nunca viram/sentiram/sofreram nenhum tipo de abuso. Mas cada relato deve ser reconhecido e tratado em sua particularidade. Se temos grupos onde o assédio não existe temos que pensar o que podemos fazer para que essa boa política se dissemine.

Os relatos a seguir são todos da mesma cidade.

“Abuso? Não, nunca vi e nem senti. Até porque o pessoal do meu grupo é muito focado. Não tem tempo para esse tipo de coisa. Mas se houvesse tenho certeza que o “Mumu” daria um jeito nele”. (Kriger 2)

“Nunca aconteceu comigo”. (Kriger 3)

“Olha, quando eu comecei eu tenho de admitir que eu lutava muito mal. Mas era mal mesmo. Eu era o alvo fácil de todo mundo no campo. (...) Alguns meninos vinham dar abraços com “segundas intenções” depois do treino, ou comentavam que eu deveria ser fácil porque eu “pegava de boas na espada”. As pessoas chegavam a dizer eu estava ali só para conseguir um tipo especial de atenção. Daí eu comecei a agir com “brutalidade”. Eu já era um pouco antissocial mesmo então ninguém estranhou muito. Hoje eu sou bem respeitada no meu grupo”. (Kriger 5)

Você não pode porque é menina
Percebi, ao longo dos relatos, que uma das formas mais comuns de perseguição é a de desmerecer a menina justamente por ela ter características do sexo feminino. Se um menino se deixa levar pelas emoções ele é “esquentadinho”, mas se é uma menina ela é “emocionalmente instável”. Um menino que arruma uma namorada no grupo está sendo “pegador”; se for uma menina, ela não passa de uma “maria-espadinha”. Se o cara é derrotado por uma menina ele diz que “pegou leve” com ela. Esse tipo de coisa é bem mais comum do que se pensa. É o que comumente chamamos de misoginia.

“Eu tinha começado a jogar fazia poucas semanas. Tinha ido com o meu namorado/ficante da época e me apaixonei pelo esporte. (...) Eu fiquei sabendo que haveria um EPS já no começo do mês que vem. Quando eu disse que queria participar do evento foi uma loucura. Disseram que eu não podia porque eu era muito fraca e tinha pouco tempo de treino. Nas palavras deles eu ia ‘manchar a reputação do time’ porque eu era ‘inferior’ aos outros ‘jogadores selecionados’ para participar. Aceitei meio a contragosto até descobrir que um ouro colega de treino, bem mais fraco do que eu tinha sido selecionado para ir ao evento. Quer dizer, eles não se preocupavam se um cara poderia manchar a reputação deles, mas se fosse uma mina era certeza disso acontecer. Fiquei tão chateada com isso que fui ao EPS com um tabardo preto que eu mesma cortei e costurei na véspera. Fui como mercenária. Isso tem três anos. Tem gente do grupo que não fala direito comigo até hoje”. (Kriger 10)

“No meu grupo tínhamos um sistema de graduação bem eficiente. Pelo menos era isso que eu pensava. O teste para sargento acontecia quatro vezes por ano. Eu fui reprovada em todas as quatro vezes. Na última vez eu fui até o sargento que estava conduzindo os testes e perguntei o que eu poderia fazer para melhorar e assim passar no teste. Ele estava distraído e por isso eu acho que ele respondeu com sinceridade: Você tem que nascer de novo, porra! Mas vê se dessa vez nasce como homem, porque enquanto eu for sargento e cuidar da graduação, você não passa. Fiquei arrasada e só não desisti de frequentar o treino por causa de alguns amigos maravilhosos que fiz por lá. Mas nunca mais tente fazer o teste de graduação de novo”.  (Kriger 7) 

“Um dos motivos de eu não ter ido para São Paulo com o pessoal foi justamente o assédio. Um colega veio conversar comigo via chat. A princípio ele queria tratar apenas de assuntos da viagem, sobre swordplay em geral, mas depois ele se mostrou diferente. Ele começou a falar dos meus seios, que por serem muito bonitos e chamativos, ele estava com muita vontade de pegar. No começo achei que se tratava de uma brincadeira sem graça. Eu avisei para ele parar de ser zueiro, mas ele continuou, insistentemente, dizendo que eu já estava avisada. Falou que ele ia pegar mesmo e que não adiantava eu ficar de “cu doce” pro lado dele”. (Kriger 4)

Ataques de onde menos se espera
Outra das coisas que ficou patente é a relação de cumplicidade e conivência que alguns swordplayers têm com os abusadores. Muitos dos abusos aqui relatados aconteceram sob a luz do dia, no campo de treino, com pessoas em volta. Existe um corporativismo muito grande dentro dos grupos de maioria masculina. Muitos deles acham que não tem nada de mais no que é feito e que tudo não passa de “cu doce” ou “mimimi” por parte das meninas. Um paradoxo dessa cultura machista é justamente o desejo que muitos grupos têm de terem mais mulheres jogando. Esse paradoxo leva a criação de uma figura interessante, batizada por uma das entrevistadas de “menino alegre”.

“Então, como eu só vou ao swordplay com o meu namorado, os meninos não chegam nem perto (risadas). Como o grupo que estou atualmente, que é o único que eu conheço, todos me respeitam. E Muito. Eu percebi que eles são bem carentes de meninas. Quando eles veem uma mulher que jogue, eles ficam bem animados. Eu acho engraçado isso, já que eu estudo psicologia. Os meninos querem as meninas jogando, mas eles as querem apenas como objetos de decoração. Por isso que eu acho que tem meninos que forçam a barra, sabe? Eles ficam rodeando as meninas cheios de boa vontade e disposição, mas tiram uma casquinha na primeira oportunidade. Eles não sabem, mas a gente percebe. Eles são os meninos alegres”. (Kriger 11)

“O meu antigo rei parecia um cara muito bacana... mas só parecia. Uma vez quando estávamos sozinhos, ele sussurrou no um ouvido: ‘se eu me separar da minha esposa, vou dar em cima de você e vou te mostrar o que é ser um homem de verdade’. Eu fiquei passada. (...) você acredita que em outra ocasião ele quis se meter na vida amorosa de dois colegas de treino? Eu achei o ó.” (Kriger 12)

“Num evento desligado do swordplay, um clã especifico foi mostrar e vender equipamentos num evento do Ibirapuera. E eu fui dar uma olhada, com a minha lança própria e tudo. Conversa vai, conversa vem, já me soltam essa ‘ah, mas a lança tá bem ruim né? Eu sei que é meio difícil pra menina fazer arma bonita, cê não quer que eu conserte ela pra você?’ Como se tivesse algum nexo, sabe? A minha lança foi feita pelo nosso armeiro, que é muito talentoso, com a minha ajuda. Fizemos juntos por que o EPS tava chegando e ele queria me incentivar a continuar treinando. E ela é completamente funcional, eu fiquei ofendida pra caramba. (...) Aí logo depois eu fui treinar com alguns lanceiros do mesmo clã. Tiramos uns x1 e conforme eu ia ganhando, cada vez mais incrédulos eles iam ficando. O cara chegou ‘até que pra uma menina você sabe usar lança, parece homem’. SEM BRINCADEIRA. E pelos esportes que eu fiz, eu já fui tão chamada de homem que eu não aguentei e revidei ‘Não pareço homem, eu só sou mulher que é melhor que muitos caras’. E ele ficou com aquela cara de ‘Ah, tanto faz’.” (Kriger 14)

“Uma vez fui num evento com vários grupos aqui em Brasília. Eu lutei com um cara e ele elogiou muito o meu jeito de lutar. Tiramos vários x1. Teve uma hora que começamos a andar em volta do evento. Esse garoto passou o braço pelo meu ombro e começou a conversar todo íntimo, me elogiando. Ele tava caminhando pra uma outra parte do bosque e eu na conversa não tava percebendo. Ai quando eu percebi ele tava praticamente na minha cara. O XXXXXXX que teve que me tirar de lá. Depois que ele me viu de novo ele falou ‘O cara era seu namorado? Pede desculpas pra ele pra mim’. Como se ele não devesse nada pra mim.” (Kriger 16)

“O principal problema comigo não foi o assédio dos ‘garotos felizes’ (gostei desse termo, vou usar!) foi mesmo ter minha moral e o respeito dos membros do grupo jogada na lama. Eu não sou uma mulher que gosta de ser tratada como donzela, muito menos ter minhas ideias menosprezadas, minha personalidade barraqueira começou a se destacar por brigar pelos meus pontos de vista, chegando até ser ignorada por um dos líderes e que até hoje não faz questão que eu frequente os treinos.” (Kriger 15)

“Minha formação de Swordplay começou no XXXXXXXX, em XXXXXXXX. Fiquei anos treinando com a galera, o que foi muito legal. Daí surgiu uma oportunidade de trabalho e me mudei para os EUA. Descobri um grupo que se reunia semanalmente perto de casa. Um grupo filiado ao Dagorhir. Quando eu fui lá fazer a minha inscrição perguntaram o que eu queria fazer: se era para ser dama de companhia, costureira, ajudante de ferreiro... eu disse que queria lutar e focaram espantados. Eles são muito machistas e fazem questão de ‘bater com força’ nas meninas. Mas não deixo por menos. J uma vez um dos caras quase trinca minhas costelas. Eu só sosseguei quando derrotei ele num torneio, ano passado.” (Kriger 20)

Tem muito mais disso aqui.
Eu tenho muito mais relatos. Mas resolvi deixa-los de fora porque o texto já está grande demais e acho que todo mundo já entendeu. Precisamos trabalhar por uma solução. Assim, essa solução passa necessariamente pela busca de uma melhor gestão do esporte e de suas relações dentro dos diversos grupos, que deve ser feita coletivamente. Isso exige que os problemas sejam enfrentados de forma sincera e organizada, por todos aqueles que estão submetidos a esta estrutura. A denúncia e punição dos assediadores é bastante importante, pois cessa a violência exercida pelo membro em questão, além de demonstrar cada vez mais à toda todos os swordplayers que as mulheres não estão submissas a essas violências e que o assédio não sairá impune.

Enfim, dado o fato do assédio ser sistêmico, constituindo-se como um problema de toda a classe dos jogadores de swordplay, o combate a ele tem de ser, também, coletivo. Todos sofrem com o assédio, seja como vítima, como testemunha, seja pelo medo de poder vir a ser o/a próximo/a assediado/a. Por isso é crucial a solidariedade e ação coletiva para acabar com esta prática, fortalecendo os jogadores contra esses assediadores.


Resumindo... Enfim, a luta é muito grande e há muito o que fazer, porém se a categoria de jogadores de swordplay estiver unida e lutar junto é possível acabar com esse mal, que cresce no nosso meio. Se você está sendo assediado, procure os líderes do seu grupo, ou alguém que você confie. A união é um importante instrumento na luta contra os casos de violência no esporte. 

domingo, 11 de setembro de 2016

Acidentes acontecem... ou não?

De acordo com o dicionário informal, acidentes são “qualquer acontecimento inesperado, desagradável ou infeliz que envolva dano, perda, sofrimento ou morte”. Segundo esta definição ao pé da letra, quando você está andando na rua e dá aquele tropeço numa pedra solta e deixa seu celular ir ao chão, trincando a tela, o que houve foi um infeliz acontecimento; quando você, sem querer, chuta a bola com muita força e ela estoura a janela daquela vizinha mal encarada também é um acidente; quando você troca o nome da sua ficante pelo nome da “ex”, também é um acidente (este aqui capaz de provocar até mortes).     

Mas eu tenho um amigo que é especialista em segurança do trabalho e ele diz que mais de 90% dos acidentes não evitáveis justamente porque eles são fruto da ação humana: negligência, imprudência e imperícia. Um pai de família resolve viajar com sua família, mesmo sabendo que o carro não passou por uma boa revisão. Daí os freios falham numa curva e todos morrem ribanceira abaixo. Óbvio que o pai não tinha intenção de matar sua família, mas foi isso que aconteceu porque ele negligenciou o cuidado com o seu veículo. Quando você está distraído e dá ré no carro sem olhar e atropela um pedestre é imprudência. Quando um médico libera um paciente com o diagnóstico de gases e depois o paciente descobre que estava com calculo renal, o médico falhou. Ele estudou durante aos e deveria saber a diferença sintomática e diagnóstica de cálculo renal e de gases.

E o que isso tem a ver com o swrodplay? Simples. Temos um esporte de contato em nossas mãos. Basta que se somem um conjunto de pequenas negligências, imprudências e imperícias para que os famosos “acidentes” aconteçam.

Tome por exemplo o que aconteceu num dos treinos de setembro de 2016 no reino dos cavaleiros da virtude. Durante o combate na linha, a lança do hoplita subiu atingindo o rosto da lanceira, abrindo o supercílio dela. Um terrível acidente, não?

Não. Quando o hoplita deixou a lança subir na direção do rosto da lanceira tivemos imperícia. A falta de manutenção da arma, causada pela negligência dos armeiros do reino, permitiu que o cano saltasse fora da cobertura de espuma e machucasse a lanceira. Mesmo antes, quando o hoplita aceitou lutar com uma lança que já estava insegura, ele assumiu o risco de machucar os colegas de treino. Sei que parece um pouco duro o que eu disse até porque toso os envolvidos são amigos queridos e tudo o que eu não queria era ver qualquer um deles feridos. Claro que ninguém faz isso com o propósito de machucar alguém. “Ah vou deixar o core da minha espada solta dentro da espuma para quando atingir o coleguinha machucar bastante, bawawawawaw!”. Mas precisamos redobrar nossas atenções e vigilância para que esse tipo de coisa fique relegado ao mínimo possível.


Então, é nosso deve deixar de sermos negligentes, imperitos e imprudentes. Era isso. Até mais ver.

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Na forja da gatosa

Olá amigos,

Como vocês devem saber eu sou um cliente da forja “Gatosas de Prata” aqui em Brasília. Apesar de achar o nome meio estapafúrdio e de achar o lema deles impropagandeável (“quer ficar gato?”) é inegável a qualidade de seus produtos.

Encomendei com eles uma espada em outubro de 2015. Os resultados da encomenda podem ser lidos aqui: http://swordplaydobetao.blogspot.com.br/2015/10/quer-bem-feito-busque-um-profissional.html. Eis que, quase um ano depois, eu precisei de reparos na ponta da espada. Mandei uma mensagem para o Victor e ele foi categórico: “Passa aqui que a gente arruma sua espada. Sem custo algum.” Isso é que é garantia estendida.

Quando você pensa em um ferreiro de espadas logo surge na sua cabeça a imagem icônica de um sujeito forte, musculoso, suado e mal encarado. Algo como  Eorlund Gray-Mane (Skyrin) ou quem sabe, mais modernamente o Tony Swatton do canal man at arms do youtube.com. A última coisa que você espera encontrar é um magrelo de óculo de grau, com trancinha de padawan em treinamento de Star Wars, atendendo no quarto dele, direto da asa sul (bairro em Brasília).

Victor é um desses caras que vale à pena ter na sua agenda de profissionais. Com “P” maiúsculo. Ele está sempre buscando novas formas de fazer as espadas, novas formas de fazer a guarda, o pomo, a ponta. A maneira como ele monta as espadas é simples e ao mesmo tempo muito inteligente, criando um formato mais próximo das espadas de verdade. Anos-luz a frente de qualquer outro ferreiro aqui em Brasília e região. Aliás, ele não deixa nada a desejar, nem mesmo das famosas espadas americanas. O trabalho do cara é sensacional.

No tempo que fiquei por lá ele me mostrou alguns projetos novos e falou das novas técnicas de construção. Ele me disse também que não usava mais o modelo de construção de espadas que ele usou na minha espada longa. “Ah Betão, esse modelo de construção é obsoleto. O que usamos hoje deixa a lâmina mais reta, mais macia e com menos efeito chicote. E mesmo esse que usamos hoje vai mudar em breve. Já estamos testando espadas no novo modelo de forja”.

A espada do meu colega de treinos, Manassés, estava lá, em fase de finalização. É uma espada “de cosplay”, segundo as palavras do Victor. “Eu nem se ainda porque é que eu ainda pego essas coisas de cosplay/anime”, comentou ele. “Deveria cobrar mais caro por esse tipo de coisa. Olha o trabalho que dá!” disse ele, rindo muito.



É... eu sei que este post está soando como aquelas propagandas da Polishop, mas não é o caso... mesmo. Quando o trabalho é bem feito temos mais é divulgar, não só para mostrar a gratidão ao ferreiro como dar a ele mais trabalho. É isso. Nos vemos em breve, gente bacana.


A Importância da Malícia e da Cautela nas Relações Sociais no Swordplay

Na complexidade das relações humanas, é inevitável que, independentemente de quão bons sejamos e de quanto nos importemos com os outros, sem...